CRISE DO CACAU: PREÇOS RECORDES NÃO SOLUCIONAM OS DESAFIOS DE PRODUÇÃO AFRICANA

Embora os preços do cacau tenham disparado nos últimos anos, produtores da Costa do Marfim e de Gana — responsáveis por cerca de dois terços da oferta global — continuam enfrentando sérias dificuldades e baixos rendimentos.De acordo com a Bloomberg, apesar de uma recente desaceleração nos preços, o principal órgão do setor projeta um pequeno […]

Embora os preços do cacau tenham disparado nos últimos anos, produtores da Costa do Marfim e de Gana — responsáveis por cerca de dois terços da oferta global — continuam enfrentando sérias dificuldades e baixos rendimentos.De acordo com a Bloomberg, apesar de uma recente desaceleração nos preços, o principal órgão do setor projeta um pequeno superávit mundial de cacau após anos de déficit. No entanto, a situação em campo é mais complexa: uma equipe da Bloomberg percorreu aproximadamente 2.500 quilômetros nas principais regiões produtoras da Costa do Marfim e de Gana e encontrou fazendas castigadas pela seca, doenças nas plantações e invasões de mineração ilegal.O setor do cacau da África Ocidental, que também inclui Nigéria e Camarões, já vinha sofrendo com envelhecimento das plantações e pragas, fatores agravados pelas mudanças climáticas. Mesmo com a cotação internacional quintuplicando desde o final de 2022, o sistema de comercialização utilizado pelos principais países produtores impede que agricultores e governos se beneficiem plenamente da alta dos preços para investir na produção.

Embora haja previsão de uma leve recuperação na safra atual, os volumes ainda estão bem abaixo dos níveis históricos. Para agravar a situação, o consumo de chocolate caiu, como reflexo dos preços elevados.

Em Gana, a proliferação da doença do broto inchado devastou plantações inteiras, como a de Oscar Bendeh, que teve de abandonar sua lavoura. A única maneira eficaz de controlar a doença é derrubar as árvores afetadas. Para combater o problema, o governo de Gana planeja replantar cerca de 500.000 hectares de cacau, mas o processo avança lentamente e requer investimentos da ordem de US$ 1,2 bilhão.

Mesmo com os contratos futuros de cacau em Nova York negociados acima de US$ 6.000 a tonelada — quase o dobro da média das últimas décadas —, tanto Costa do Marfim quanto Gana vendem a maior parte da produção antes da colheita, o que os impede de capturar integralmente os ganhos de mercado. Além disso, os agricultores recebem preços fixados pelos governos, o que limita sua renda em momentos de alta internacional.

Diante dos baixos retornos, muitos produtores migraram para a mineração ilegal de ouro, especialmente na região de Tarkwa, em Gana, degradando ainda mais as terras agrícolas.

Na Costa do Marfim, os repórteres encontraram sinais claros do impacto de uma seca severa, a pior dos últimos seis anos, com plantações estressadas e baixa frutificação. Embora haja expectativa de chuvas que possam melhorar a situação, o clima adverso já comprometeu a produção da safra intermediária.

A dependência do clima e a falta de sistemas de irrigação tornam a recuperação incerta. Agricultores como Yabao Madi, de Duekoue, relatam perdas significativas e dificuldade para manter a produção. As chuvas esperadas nos próximos meses serão determinantes para o desenvolvimento das vagens destinadas à colheita principal, que começa em outubro.

Por enquanto, o mercado mundial de cacau depende da queda no consumo e de novos aumentos nos preços do chocolate. Além disso, tarifas adicionais nos Estados Unidos podem pressionar ainda mais a cadeia produtiva.

Segundo especialistas, mesmo que haja alguma recuperação, dificilmente a produção africana retornará aos níveis anteriores às crises climáticas e fitossanitárias. “Precisamos ver a evolução das novas safras para ter uma noção real de como o mercado se comportará”, afirmou Jonathan Parkman, do Marex Group.

Fonte: Bloomberg

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